25 janeiro 2013

Ah, Sexta feira... (ou o colo da Avó)...

Rumo a Norte ao por do sol. Aos meus atalhos, às minhas esplanadas, ao meu doce nevoeiro, à curva que o rio faz antes de encontrar e se perder no meu mar, tão revolto. Rumo a tudo que também vive em mim, àquela luz difusa que é preciso aprender a compreender para a deixar correr célere nas veias. Rumo a Norte por mais dias que os dois de sempre quando posso, com obrigações que cumprirei o melhor que sei e que faço com prazer. 
Mas vou principalmente porque a minha Avó Materna, a única que me resta, faz hoje 86 anos. A minha Avó chama-se Maria Alice e tem olhos cinzentos, gastos pelos anos e por tudo o que eles lhe deram, uma vida cheia. Em tempos, foram azuis cristalinos, claros, profundos. Há poucas fotos dela quando nova, mas as que vi, já desbotadas, mostram-me uma jovem muito, muito, muito bonita. A minha Avó é baixinha, curvada, com a cara cheia de rugas profundas, rugas vividas e marcadas profundamente. Também ela, curiosamente, foi filha única numa época onde tal era visto como anti-natura. Pariu 9 filhos e criou 7 com a sabedoria que desejaria um dia vir a ter, a que não se aprende nos livros,  que esses apenas chegaram à 4ª Classe. E mesmo assim, faz contas de cabeça muito melhor que eu. Criou os filhos quase sozinha, sendo que o meu Avô era homem pouco dado a tudo que se relacionasse com os descendentes, que não os fazer. Quando o meu Avô foi fulminado por um AVC, cuidou dele incansavelmente durante anos. O meu Avô perdeu toda a mobilidade e capacidade de comunicação, ficando preso num corpo sem dono e numa mente intacta, sendo a minha Avó a única capaz de decifrar as suas necessidades. Uma pneumonia acabou por levar a melhor. No dia em que a minha Avó o enterrou, uma parte dela também ali ficou. E nesse dia, a idade abateu-se sobre ela. Hoje, move-se com muita dificuldade, imagino que numa dor constante que ela insiste em dizer (-me) não existir, mas que lhe leio nos olhos. Tal como lhe leio nos olhos a alegria que sente quando chego a ela com um chocolate ou uma caixa de gomas, uma alegria genuína, quase infantil. A mesma com que recebe o meu abraço e o meu beijo. A mesma com que mantém o seu riso e lágrima fácil. Aprendi muito com o que a minha Avó me foi ensinando, mesmo sem o saber. Um dia, disse-me "Filha és, Mãe serás" e eu nunca o esqueci, apesar de só anos mais tarde compreender o que me queria dizer. Claro que como boa Transmontana, é um poço de ditos e palavras maravilhosas, que guardo em mim, porque em mim vivem. Hoje, faz 86 anos. E apesar de rumar a Norte ao final do dia me saber a voltar aonde pertenço, a uma Cidade que me quer perdidamente e por isso me enfeitiça, me prende, num tango, volto com a felicidade de mais uma vez, lhe poder dar um beijo, no dia dos seus 86 anos. Parabéns Avó! Obrigada pelo teu colo durante toda a minha Vida e que a mesma, me deixe repousar a cabeça no teu regaço por muitos, muitos mais. 

5 comentários:

Magui disse...

Adorei o teu texto... Emocionei-me ao lembrar-me da minha avó... Um beijinho enorme

raquel disse...

Adoro!
Tenho tantas, tantas saudades da minha avó.
E nem de propósito, tenho pensado tanto nela...

raquel disse...

Adoro.
Tenho tantas saudades da minha avó.
E esta semana tenho pensado tanto nela.
Um beijo grande!
E muitos, muitos parabéns À tua avó Maria Alice (gosto tanto, tanto desse nome!)

M.P. disse...

Escreves muito bem.
Um beijinho de parabéns para a tua avó.

Pitú disse...

Maravilhoso texto! E parabéns à avo!!!