12 novembro 2012

And all the science, I don't understand...

O meu Avô paterno era um homem genuinamente bom. Chamava-se João. Era baixinho, de bochechas rosadas. Enviuvou muito cedo, a morte ceifou-lhe a mulher, que perdeu para o cancro antes dos 60. Não era dado a beijos, nem a grandes manifestações de carinho. Era de lágrima fácil, mas envergonhada pela dureza que o ser homem impunha naquele lugar recôndito, perto da raia, atrás dos montes. Costumava receber-me com alegria verdadeira nos olhos, ao ver a sua primeira neta e a única que herdou o nome de família. Na brincadeira, dava-me uma nota para ir beber uma cerveja com os amigos, dizendo isto enquanto me piscava o olho. Achava que era Juíza. Não adiantava explicar-lhe que não, que fazia outras coisas, que passava o meu tempo entre livros e papéis, que me haveriam de levar a trabalhar com o que lhe tinha levado a minha Avó, cedo demais. Dizia que eu era reivindicativa, que me agarrava às ideias com força cega. Morreu a achar que lutava pela justiça entre os homens. Hoje lembrei-me dele, logo de manhã. Do seu ar bonacheirão. O meu avô morreu sem conhecer a bisneta, que apenas saberá que o Avô João era um homem bom pelas histórias que um dia lhe irei contar. Também ele, perdeu para o cancro. E eu, continuo nos livros e papéis. Não a lutar na justiça dos homens, mas a querer perceber porque leis se rege esse covarde. 

5 comentários:

Magui disse...

Até me vieram as lágrimas aos olhos... Um beijinho gigante

Bi disse...

Por favor não desistas!!! Eu sei que não te facilitam a vida, mas não desistas!!
É tão difícil ver os nossos nessa luta desigual…

Um grande beijinho*

M.P. disse...

Só podia ser João. Não há João sem um bom coração :-) Eu também sou João, assim como o meu filho, e também o meu avô, que tal como o teu foi um homem genuinamente bom, dedicando grande parte do tempo da sua curta vida a ajudar os outros a terem uma vida melhor.
Adorei o teu texto.
Um grande beijinho

raquel disse...

Adorei o texto.
A ternura, a dureza, a força, o carinho, a doçura, que existe neste texto!
Um beijinho enorme*

Ana disse...

Adorei este texto. Penso muitas vezes no facto de o meu avô materno não ter conhecido o meu filho. Penso em como ficaria apaixonado por ele...E eu, não raras vezes, dou por mim a segredar ao meu pequeno as histórias do meu avô.