[vivi muitos dias da minha vida verdadeiramente zangada com o meu corpo: porque tinha 10 microgramas de celulite aqui; porque tinha a pele mais flácida ali; porque devia ser 3672 gramas mais magra, 12 cm mais alta; porque não era o que o que queria na minha mente doente. vivi muitos anos zangada com ele. maltratei-o. e maltratei-me a mim. agora, de cada vez que adoeço, como nos últimos dois dias, penso que agora é o meu corpo que está zangado comigo, verdadeiramente zangado comigo. havemos de fazer as pazes. agora agradeço o e ao meu corpo. as cicatrizes que carrego, as estrias que se formaram, as rugas dos anos, das lágrimas e dos risos, o milagre de, apesar de tudo e contra a estatística, me ter permitido gerar uma vida, saudável e perfeita, no meu ventre. agradeço-lhe a resiliência para quando tudo me parece demais não me fraquejar. havemos de fazer as pazes. eu já as fiz. ]
Podia ser pior. Pode sempre. A recuperar de mais um episódio das heranças de família, continuo a pensar que apesar de tudo, mais valia estar na lista de heranças os pratos e canecos de porcelana, aquela louça cara horrorosa e aquele serviço de chá inglês às flores rosa, que diz que custa uma pipa de massa, mas que a mim só me aflige as vistas. Não há cães de louça para herdar, o que é uma pena, porque dava um ar kitsch à coisa e sempre os podia por à porta de casa a ladrarem aos vizinhos de cima, bichos horribilis, que me agoniam com tanto berro, todo a santa manhã, todo o santo fim de tarde. Quase boa. Não tenho tempo para doenças.
as melhoras.
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