Por esta altura, suponho que o S. está sobre o imenso azul do Atlântico. Ou ainda a arrastar-se por Barajas, onde se lamentava que ia esperar umas horas pelo voo que o levará a uma vida nova. A um recomeço. Foi mais um caso de ódio à primeira vista no meu historial de recomeços. Até hoje, ambos nos lembramos da primeira vez que nos vimos, apresentados por aquela que viria a ser a nossa Chefe comum. Eu pensei porque carga de água está este caramelo a olhar para mim assim. Ele pensou que raio está esta Barbie de T-shirt cor de rosa a fazer aqui. Levamos o nosso tempo. Em boa verdade, foi mais o S. que se esforçou por me conhecer e me integrar no meu novo (agora semi-antigo) local de trabalho. O ódio à primeira vista acabou por se converter numa grande Amizade. Crescemos juntos à medida que os anos do Doutoramento iam passando por nós. Rimos muito. Desabafamos muito sobre tudo, sobre nada, sobre quando tudo corria de mal a pior. Discutimos ciência mas também sobre a catota do ribossoma, porque a vida se expande fora de batas brancas. O S. foi (e é) um pilar importante, muito importante para mim, quando o que mais queria era atirar tudo aos cães. Sempre me ajudou em tudo o que precisei. Sempre teve tempo para ouvir os meus disparates. Para se rir de mim comigo. Para perceber quando "agora não fales comigo que eu mordo". O S., por esta altura, talvez esteja sobre o imenso azul do Atlântico. Ou ainda por Barajas, talvez a pensar nos meus sábios conselhos (ou não) de que as dutty free são o melhor queima tempo em escalas. Honestamente, não sei bem onde o S. anda. Sei que hoje partiu para um recomeço, para uma vida nova, do outro lado do azul imenso do Atlântico. Honestamente, também sei que isso pouco importa. O S. fará sempre parte da minha Vida. Recomeçar não é simples, tem um preço associado. Mas sei que vai correr tudo bem, nesse novo País, nessa nova cultura. Sei que sim, porque sei que ele merece o melhor que esta nova vida tiver para lhe oferecer. O S. é uma das minhas Pessoas. E sempre será.
(S. se leres isto, livra-te de me vires perguntar se agora estou a ficar mole e sensível. Ou se o fizeres, ao menos avisa primeiro que chegaste direitinho para eu não te soltar os cães)
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